Wednesday 24 November 2010

to write

Como, como pisar a calçada daqui em diante? como isso se dá? Poderia fazer como sempre faço; cuspir imagens, frase em inglês, achismos, poderia fazer como você e viver a dor de escrever sem poder confessar. Poderia dizer "o artista deve estar onde o mundo está", mas não sou Milton (aquele de Três Pontas), poderia escrever aquela de Camus, "o destino não é uma punição", mas quem sabe exista destino e ele seja irremediável e esteja traçado, delineado à caneta.

Passos hesitantes pelos tapetes... através dos tacos soltos, das calçadas desdentadas com suas pedraemoitinhas, até

reverter e repetir discursos, pois como era para Kundera é para mim: a felicidade é o desejo pela repetição.

Meu taurinismo auto-indulgente, sensual e palatal se engalfinha com as teclas durante as noites de chuvas gordas, enquanto você atravessa a cidade escura a pensar em mim.

Sendo assim, meu escorpianismo obscuro, místico, beligerante por vezes escreve.

Meu aquarianismo escreve no ar, redondo, tombalhante, sem volta.

Penso em continuar junto à beira onde pequenas inspirações poéticas decaem sobre mim, respingando palavras salgadas em meu rosto. Mas nunca me basto.

Oh, ventilador negador de sonos, pálido encolhimento do eu.

sou pássaro ruim, acabo lhe desesperando, causando saudades com meu voos repentinos, com minhas distâncias repentinas, com meus planos delirantes de embalsamar o mundo em mãos e soltar, largar tudo e fugir.

Empilhando estilhaços do futuro e ainda consigo sentir árvores fruindo, invadindo meus caminhos.

Escrever é a sede, a fome de não precisar mais viver.

Friday 19 November 2010

A heart that's beating in every page

Gosto de coisas ridículas como livros de citações, também gosto de peixes, gosto de qualquer coisa a ver com o mar, das estradas, do cheiro, das cores e luzes, gosto de árvores, plantas e florestas, gosto de livros novos e antigos, gosto de histórias folclóricas, de poesia macabra, ruínas de antigos impérios e coisas perdidas, gosto de pessoas difíceis, gosto de sangue, brigas, noites sujas e decadência, gosto de cigarros longos e bebidas baratas, eu gosto de você... quando abaixa a cabeça e não sabe mais o que fazer, quando cai e quebra em lascas de lembranças e solidão, quando diz não sentir mais nada há 2 anos, sabendo que sente, e gosto ainda mais quando volta e me circula, mas eu não reajo.

Você gosta de mim também, por isso reconhece os anseios, os olhares, as correntes nervosas, aquela esperança, aquele monstro que vem rondando, inflamando em nós.

Gosto que pulamos nesse rio, nesse lodo, vou sempre lembrar que eu tentei.

"Don’t be afraid anymore. Not of anyone. Not of anything. Nothing. Ever again. Listen to me: not ever again."
— Marguerite Duras

Tuesday 16 November 2010

This is right

Esta é a maneira cega de tentar entrar em contato com os fantasmas que me habitam; escrever cartas. Cada lasquinha de papel é a vítima em potencial que utilizo para comunicar às pessoas-anônimas-imagens que não sei reprimir. O que mais arde é me perder nos caminhos da prosa e ter que morrer diariamente após queimar o último cigarro, após calar a última urgência, após o hesitar da última voz, e perceber que não há como escapar de ter que ser feliz, de ter todo dia lugar cativo em seus planos, em suas noites de vadiagem e em seus dedos longos que me apertam com muito esmero. Parte de mim irá fugir para uma outra década onde não tenho que viver tanta juventude e a outra estará exatamente aqui.

Quem sabe de nós - que escrevemos e palpitamos apesar do abismo despencado no estômago-, quem precisa saber?

Escrever por não mais conseguir ser, escrever para rodopiar no caos e do caos ressurgir, escrever para mim e para ti, por mim e por ti.

Friday 5 November 2010

I want a god who stays dead

The plants are crawling back into the house with their terrible claws, maybe it's time to leave...

(A cada recomeço uma visão peregrina desbrava, só nunca sei como continuar a ideia, escapam-me resoluções. Cada vez que penso, pensamos, estar tudo acabado, os reencontros - motivados pelos mistérios cósmicos de do caos cuspir harmonia, de unir o inacabado ao plano circular de todas as forças - ressurgem numerosos e palavras mágicas brotam de nossas bocas como dentes novos.)

Sou desperta por um espasmo seu ao meu lado, mas como...

Nós, os pós-modernos costurando as estruturas umas nas outras hahahaha....

Desmontei-me, mas a brisa reconstrói...

Não vi o fim e não consigo viver o fim...

É devido lembrar aos senhores que há um grande desfalque de esquinas, túneis e luzes e faróis e lutas de gangues e rosas e quartéis e ar salgado nesta cidade de.....

Você, que inesperadamente tem mais saudades e receios do que eu...

Peles e pêlos encobrem feridas, trepadeiras recobrem a casa...

Maestro cada movimento insólito...

Tenha a decência de amar um deus morto, admitir-se filho de seu passado, todo ele amarrado a ti feito armadilha, atado às tuas costas, carregando teus rastros de lesma pelo mundo.

                     arrasta-te até a mesa, pobre covarde, criança corada criada como que única no mundo, cada garfada é uma lembrança, uma culpa, um certo nojo de si,

                                   alto mastigado desespero que lavado a café, à cachaça, à maré, maré, maré...

O que aconteceu comigo ontem, amanhã será contigo, não se pode negar cada volta da ciranda que vem e essas nossas mãos dadas apertadas úmidas dedos brancos alastrada de músculos repuxo de tendões até que a ciranda pára e somos jogados um de encontro ao outro na multidão de rostos e braços, então finalmente sorrimos, pois fomos treinados a sorrir quando temos medo...

As palavras anoitecem na calçada, não sei tomar partido e acreditar...

Ainda não sei terminar nem começar, nem dizer, mas tentativamente, me escorando pelas paredes, digo

Sim.

Sunday 31 October 2010

A flying message

- But so many people seem to want this very same future...


- Well, fine. We'll be a legion of mad crackers with pink hairdos and a bunch of sick cats to feed until the day we're found dead at the bottom of the stairs, our faces half chewed on, 3 days too late for anyone to care.


- You feed on misery.


- I feed on life.


***

Contudo e mais um pouco, não serei esquecida. Creio que sou chata demais para escapar à memória. Sou membra vitalícia de sua solidão, de suas decisões impulsivas, do frio que lhe faz nos dias em que não estou.

Esmago o último mês com a força das mãos. Esmago o último ano como uma maçã podre.


Ontem às 3, o gato se espreguiça no tapete da cozinha - dengoso, delgado. E você, querido, você quando foi beber de cair na calçada e caiu em mim do outro lado da galáxia... você se lembra?

Já nem sei mais. Não sei pedir.

A gente se encaixa em qualquer lugar. Nos reencontraremos, e para mim, o universo de meus sonhos é todo redondo e a existência segue os círculos misteriosos, tão surpreendente quanto a gota de chuva que atinge seus óculos e muda a visão.

E estive só. A solidão nos comprime no tempo, nos alastra no tempo, é o norte na floresta, uma gota cada vez mais distante, menor e menor entre as folhas e formações rochosas.

Tudo que me foi tirado eu cato dos lixos entulhados pela cidade, eu pego de volta (sim, ser não é ter e ter não é ser, mas eu quero os dois), tudo meu retorna como numa rajada de vento. O que há? Aprendi a acreditar.

Pois estou louca, não vê? Uma loucura visionária, com a habilidade de saber o curso das palavras, de não precisar transitar entre as decepções, pois a única pergunta dign que se pode ter em mãos é,

Por que não?

Saturday 30 October 2010

You can break all the rules

É difícil escrever agora que respiro de novo.


Sua memória de mim lhe atinge em sucessões ébrias, pois sabe que eu teria deixado os espaços mais suaves, e mesmo que tão receoso ainda, de repente se cansa de sua forjada liberdade - para alguém tão jovem, que não sabe se desapegar de si, nem de seus deuses imaginários, a liberdade torna-se uma bigorna- , assim de mansinho se esgueira em minha direção. Me procura pelas beiradas das cenas, dos dias, das falas dos outros e cada palavra minha, um soco, cada falta minha, uma noite mal dormida. Não é que eu seja algo vital, apenas entendo melhor do que a maioria.


Retiro de mim cada um como um contrato desfeito; os esparadrapos, as restos, os suores, a surdez, a solidão, o seu cheiro, o debater-se em cantos vazios. Agora retenho o que achei estar perdido, aquilo que eu sei que não preciso, mas é o que eu quero, pois até nesgas de luz fraca são melhores do que apodrecer na escuridão.

Sunday 24 October 2010

In plain sight

O som de sua própria voz quando longamente assim se alastra lhe agrada; é quase um horizonte. Ele disse poder enxergar o fim dos tempos e que havia ficado cego assim como os profetas ficam cegos e que não se importava por demais com as quedas ou com os hematomas agora recorrentes, de todo, jurou que pouco importava ser ignorado, vilipendiado ou não ter mais notícias do presente, porque possuía o caos universal dentro da barriga e seu umbigo era como um olho, mesmo que doente. Pois saiba que os profetas também mentem. Desesperadamente.


Ela jacta-se de caminhar pelo deserto adentro, mirando-se nos heróis que não existiram, ou dessa maneira faria se lhe calhasse o tempo, (re)clama que se o destino (destino, destino, desatino; anseio alcoolizado de ter para onde ir) permitisse, passaria um ano debaixo dessa chuva, pois de perto é bem mais certo do que viver aqui, disse ainda conseguir cortar a própria cabeça com um machado cego e fodam-se os pássaros que recorrem rasamente os céus, foda-se a calúnia que é escrever profecias, foda-se que cartas, chuvas e desertos são meramente os rastros da solidão. De barriga cheia é que não se vai longe.


Segue-se então, o nado latente dessas duas pessoas cruas tão desejosas de serem observadas como que invictas, intactas, indolores. O que possuem, além de limões bem cortados, além do conforto manso de nunca enfrentarem quem elas pensam que são e dos antigos rasgos profundos no peito, são suas mãos - que espatifam copos na pia, juntam-se aos olhos quando deles caem lágrimas, engasgam palavras, escrevem lembranças, soturnidades, culpas e repartições - , mãos que quando cá se reencontram, ah, abarcam um futuro em plena vista, mesmo que elas mesmo já não percebam.


Veja! A antiga sorte carregando-nos em seus braços, atenta e barulhenta feito um bebê.

Wednesday 20 October 2010

Dawn of our times

Fecha os olhos, solta uma risadinha, enfia o punho na manteiga e se pergunta, por que não hoje?

Afinal, vive-se hoje em um mundo de homens covardes, infantis, frios e de mulheres artificialmente poderosas, vive-se num mundo pidão, num mundo-criança-mimada-batendo-os-pés-no-chão-de-raiva, vive-se em um mundo onde o tédio é a gasolina da rotina, onde o amor é conveniente e prático e morto como nossa presente vida urbana - não que "a paz" do campo seja melhor - , onde há tanto profissionalismo, tanto pragmatismo, tanto dogmatismo nas artes que perdeu-se a possibilidade de ser inútil e belo. Ao mesmo tempo em que muito da arte se tornou inútil e belo por comodidade apenas, não por paixão.

Aceito que não sei, porque sei de tudo mesmo não entendendo nada. Não escrevo coisa com coisa, não filosofo o que for, me recuso a seguir as estruturas, porque não preciso, não quero fazer sentido, compreender o sentido ou viver em uma realidade extremada e completamente forjada a qual os aleijados emocionais se convenceram a chamar de vida. Questiono para viver humanamente, não para entender a vida.

Desejo apenas que seja bonito com o conceito de beleza que me cabe e que me é devido, pois sim desejo que os beijos inconsoláveis e as lágrimas de desculpa e de muita culpa e os leiçóis no pé da cama e o corpo-personagem-de-meus-cantos sobre o meu corpo e que a noite, as luzes, a chuva enlacem e desenlacem todos os dias daqui em diante, isso que eu não entendo, mas que é meu, eternamente meu.

Saturday 16 October 2010

Tango till you're sore

Olha mas que barriguinha amarela e o olhar!fixo no horizonte, em mim, ai ai ai, o que irá fazer, para onde esse desejo se/me atravessa? O cigarrar das cigarras corta a saudade ao meio, os pássaros não mais anunciam partidas ou chegadas, apenas rodopiam, sem frutos a bicar ou ninho a que voltar.


Você tropeça na escada, abaixa a cabeça e engole seco a culpa e a dor por ter fugido tão impulsivamente assim, pobre rapaz.


Olhe a tonteante lua, botãozinho q-quebrado no céu, com nossas mãos dadas, somos atirados de encontro um ao outro pela multidão.


Quanto o tempo já nos faz...


Estranho como ainda conseguimos falar aos milhares, podemos renascer, livres dos velhos desencantos, pois agora coroados de toques que brotam macios e ébrios, who are we to deny the heat?


O que há comigo, se pergunta. Por que não completo os textos? Os contos? As ideias? Para quê? Se tenho aqui as fotografias queridas, renovadas, tremidas por minhas mão úmidas que escapam e escorregando caem através de suas costas, suas pernas, seu ar.


Reverenciada seja a chuva que salpica as janelas, atravessa os dedos por entre meus cabelos e... não me beija com tanto esmero quanto você faz todo dia, ainda assim, mas que beijo!

Friday 1 October 2010

I'm going back east

A dança mais bonita que dancei foi com uma folha seca na piscina.

Não há cura para esse sol que pousei sobre sua cabeça cansada.

O seu coração palpita. É noite, noite, somos tão jovens...

A rosa branca é rosa.

(Cai caisim cai cálida branca do céu ao chão)

Perfume branco de branco-rosa envolve os meus mistérios.

As fotos na cabeceira, cartas por entregar, olhares encantados, mãos que deslizam lentas sobre minha pele febril, haverá resposta?

Um rosto colado ao meu, vontade de não ter que se despedir jamais, me a solidão, o antigo carro-chefe.

Dias, tantos, e a luz...

Um beijo junto ao peito e o vento que nos carrega para perto de nossos braços. Mais ávidos e imediatos que o medo que por vezes lhe tira a visão.

É no escuro que recebo o abraço mais querido, o aperto mais sentido e a vontade de me fazer universo, verso unido, completo.

O que fará comigo, folha seca rodopiando em volta de meu corpo, tão pequeno, tão pálido ainda?

O medo de não saber nadar na correnteza que criei em seus caminhos. Soltei-nos do envólucro da apatia, do lascado casulo da angústia do ser.

Ô, pessoa que conta mentiras a si própria para não me amar.

Pessoa que desperta quando eu desperto, passa mal quando estou mal, como uma sombra que copia essa coreografia de não mais viver o eco dos dias.

Palavras dispersas, perfumes dos mais certos, a tarde que nos oculta em seu santuário, e se há porto, se há mar, que uma jangada seja construída, que haja sobreviventes, pois precisam de nós.

Como é difícil escrever com esses braços em volta de mim, com essa falta de ar, essa fissura, beijo meu que rasgou-lhe a jugular, beijo teu que levou-me à tona.

Me dirá sim e estará curado.

"yes when I put the rose in my hair like the Andalusian girls used or shall I wear a red yes and how he kissed me under the Moorish wall and I thought well as well him as another and then I asked him with my eyes to ask again yes and then he asked me would I yes to say yes my mountain flower and first I put my arms around him yes and drew him down to me so he could feel my breasts all perfume yes and his heart was going like mad and yes I said yes I will Yes." — James Joyce

Friday 24 September 2010

A night like this

Ah, sei que é difícil explicar como compreendo o seu medo, talvez por ser o mesmo que o meu.


É noite. Caminhamos a passos largos por entre ruelas escuras, viramos as esquinas, conhecemos cada calçda quebrada. Ora, a cidade é bela pois insignificante, esquecível, um palco sem cortinas na mata seca. Seus moradores, cada qual com sua fala, seu universo, nunca em harmonia com a cena seguinte, com os personagens que seguem os descampadosterravermelhacéuemchamassolidãolongelongelonge. Queria tanto que essa terra implodisse e decaísse em depressão.


Pisco em descompasso e repentinamente percebo ruas desasfaltadas em areia, gente de longas canelas, pé chato, descalço, cabeças cobertas por chapéus circulares brancos, e mãos, quantas delas, encharcadas pelos rios da vida, tanto desse pó e rastejantes galhos secos no trajeto até lá. Vejo uma realidade maravilhosa de poeira, arei e gente escura. Surge lá bem fundo na casca essa rodopiante maresia anunciando consigo o mais temeroso dos mares; de tempos em tempos, me vem à mente imagens da África, o terrível coração do mundo. De África vou e volto no embalo de memórias entre a vida que sonhei e de uma outra que não escolhi, vou e sempre volto a me situar nessa terra vermelha e na tontura seca de viver aqui.


Quando não estou sonhando, estou atada à terrível densidade de nossos apertos de mãos. Ou seguindo qualquer silogismo óbvio já que a música está tão alta que mal consigo discernir se é realmente música o que está cuspindo dos amplificadores, e percebo ainda além; o álcool toda vez abaixa a cor de seus olhos, rasga-lhe um sorriso no rosto sem alvo ou direção.


Cumpro o abominável ritual de faltar com as obrigações, desconversar e sabe-se lá onde é que a lua se escondeu? Me arrebata uma juventude, uma vontade de gritar, lhe bate um ciúme, uma vontade de me arrancar dali, para longe daquelas mãos e olhares estranhos, invasores.


Não somos gatunos da noite à toa, meu bem; desvairados, a cabeça cheia de luas, dizeres e contatos, eu com meu cigarro no canto da boca, cantiga africana nos dedos, hematomas desgastados; você com os seus humores febris, suas certezas, sua culpa, sua memória irredutível, seus arrependimentos,


... naquela dor de parto diário de se arrebentar para o mundo e se descobrir só, bem, só até eu chegar.


"Não venha com meios-termos, com mais ou menos ou qualquer coisa. Venha à mim com corpo, alma, vísceras, tripas e falta de ar. " - Caio F.

Thursday 16 September 2010

Peasant ways


A árvore da vida, de última, pariu um terrível carneiro; sem pêlos, o mais puro cordão umbilical ensanguentado, sem visão ou remorso de viver.

Percebo sua incômoda presença em todos os cômodos, aqueles pequenos olhos enxergando um oblívio interior.



Não durmo desde o verão passado.



Arrasto os pés descalços pelo jardim, - já imagino as unhas encardidas de terra, impossíveis de limpar - , pelo jardim como quem caminha à forca, desviando dos morcegos, sendo louvada pelas cigarras, pelas pitangas, pela mangueira furada, pelos perdidos, carcomidos, jovens embrutecidos da seca. Esbarro em uma lima-da-pérsia e assim decido que a ira é o único sentimento que reconheço. Essa ira me faz desejar uma caldeira descomunal, uma terrível boca-do-diabo que destrua o carneiro, as limas, os morcegos, o inverno, a ácida mordida da solidão, minhas frases e fases desmontadas.


Ah, um salve a todos nós, os provincianos, juntamente com nossas deliciosas e insólitas supertições!

Thursday 9 September 2010

Soft shock

Acordo com o seu rosto inconsolável afundado no travesseiro.


Admito, tenho visto rostos à beça, minha parede mesma é cheia deles. Rostos tristes, pensativos, eufóricos, apaixonados, ansiosos com as contas à pagar, a poluição, o trágefo que irão enfrentar ao sair para buscar os filhos na escola, reprimindo epifanias, saciados, sádicos, dopados.


Não incomodam, penso devagar, e olha, tendo a pensar rápido em dias com noites como estas, então é bom se dar trégua e falar arrastado, sorrir desdesejosa e tracejar com a ponta dos dedos um rosto inconsolável na parede para depois tracejar com a macia língua um peito em constante palpitar à minha esquerda.


Que eu tenho razão, já sabia. Erro pouco agora que os dias tem me oferecido demais, não sobra tempo para errar. Conta mesmo é ficar aqui me espreguiçando, dedilhando no ar as melodias de ontem. Nada de me empoleirar e escrever uma conclusão bonita para essa história que nem está perto do fim ainda. Prefiro não abusar. Relato episódios futuros como as mãos precisas de uma cigana com as cartas na mesa. Ora, se acerto, apenas meus olhos não disfarçam o pequeno triunfo, como eu disse, é melhor não abusar. Ter; coisa mais agustiante, bovina, perene, suspensa no ar!


Agradeço por ter chegado até aqui sem qualquer ideia fixa do que é viver, do que é o encanto, do que é ser mulher, ser amada, e quando me pedem para justificar as palavras e os atos, digo logo, irrelevante, defina você, no ato.


Essas palavras, essas ações, são tontas e distraídas como aquele fio de água desenhado na grama ressecada. Prefiro não compreender, pois se tentasse, teria que tentar entender também o porquê de nada morrer entre nós, o porquê de conseguirmos driblar todos os desvios.


Toque a pele inteira à sua frente e ria da absurda necessidade alheia de nada saber apertar.

Wednesday 1 September 2010

I dreamt that I dwelt

Ô, menina sumida, menina atrasada, fazassinão, você trilhou meu corpo tantas vezes com a ponta de seus pequenos dedos, com a ponta de sua língua demorada, por que desistir agora, agora é o recomeço... para mim.


Encontram-se na sala, essas pessoas jovens, e todos fitam o quadro na parede. Cada um vê uma cor, traço, contorno ao seu modo, porque é assim que jovens em salas veem o mundo, só ela que quando olha para frente vê a si, ampliada, sem fronteiras, ela mesma, demais. Aqui está sua própria sombra; pisa firme à sua frente, e ela só dorme depois do galo cantar, seus pés descalços dentro d'água ficam lá parados enquanto o mar rasga-lhe os tornozelos.


Teria sido sempre assim?


Essa menina, tão ampliada, cortadora impiedosa de arestas, filha dos mares do sul, amante/inimiga, minha, minha, minha parasita, fungo que me inchou o peito? Pois não entendo se estou mais, se existo ainda, ela me parece tão cansada, revoltada, revoltante, apaixonante...


Houve um tempo em que seu rosto deu-me tédio; amplitude também cansa. Via os dias estáticos como caixas brancas iguais, enfileiradas sem fim, seu rosto adorável dentro de cada caixa a me exasperar. Não sei o que abortou a revolta e a vontade de dilacerar o futuro, mas quando dei por mim já estava aqui com essa febre: suando frio, numa porra de saudade irracional, esperando ver os seus cabelos negros, seu nariz vermelho, suas roupas monocromáticas, seu senso de humor irritante, sua demora arrastada angustiada contada partida... chegada.


Ai, menina que me atrasa, palpitar involuntário idiota, como se impregnou dentro de mim? Queria a vaga liberdade de gritar, "sou eu que dito, bebo, traio, vou e volto, sou eu que me revolto, não você", queria poder me negar. Esse eu, que no meio desejei o fim, agora sei que não há mais como lutar contra esse... algo-similar-àquela-antiga-rede, aquela que me prendeu uns anos atrás.


Do pensamento não se (es)vai.

Friday 27 August 2010

You're just skirting on the surface

Essa é a nossa diferença.



Sou densa, lenta, tolerante e paciência como os antigos, e você, ao contrário, julga compreender a fala do outro por ter pescado de soslaio o movimento da boca ao lado. Aquela saborosa fruta (e sabe-se que é uma fruta saborosa, pois alguém um dia teve a paciência de esperar o tempo maduro antes de entregá-la a você) ainda é verde, dura, ela pendula distraidamente no galho antes da estação... só você é aquele que por impulso à flecha ao chão e a rói até doer-lhe os dentes, pois o sabor é uma figura muito menor do que o ato da captura imediata.



Por isso, digo: Você nos antecipou, nos queimou na areia. Agora, reclama do gosto amargo, enquanto eu tomei o tempo de amaciar esses novos sentimentos que eventualmente você sentirá por mim.



Talvez o que me salve nessa dança prematura é que você sabe se renovar e me amar novamente, toda vez, cada dia mais.

Saturday 21 August 2010

Black flowers blossom

Sou a amante perfeita, e por isso, a amiga relapsa, mas há conserto. Se eu pudesse dizer que vivemos de algo, diria que vivemos de remendos, costuramos as falhas dos dias com mãos precisas e olhares atentos. E talvez por ser eu da terra, comunico-me com a vida muito bem através das mãos.



Toda náusea, toda vertigem é breve, menos eu, menos você, por mais voláteis que sejamos. Meu caro, o seu cansaço, a sua factualidade, a sua fixidez com esse plano astral, a sua noção de realidade, tudo isso me faz rir. Meu propósito, se é que tenho um, é entrar em sincronia com o universo, um universo qualquer, um universo no qual, com muito esforço, me propuz a acreditar que existe.



Eu sei, tolas palavras jorram delicadas e gentis em minha direção. Aceito. Acho que os outros também percebem, me olham incertos, quase me dizendo que o laço está perfeito, mas a Gab é tão difícil, melhor não dizer.



Reconheço que não nasci para a fleuma e o sol alegre e vazio, também faço pouco caso das noites fulminantes e suas luzes coloridas, mas esse sol me chama. Aceito. Não estar só talvez me apavore mais do que caminhar sozinha, mas acontece que realmente não estou mais só. Dói ter alguém, adaptar minha visão, meus dedos, mas aceito. Aceito o que os longos dias me oferecem, aceitos os beijos demorados, abraços hesitantes daquela pessoa inconsolável. Não sei o que significa, apenas percebo que me contradigo e faço pouco esforço para manter a linearidade desse blog com meus posts de opiniões opostas, sim, andei lendo, mas é porque as palavras, em especial, as palavras dos outros, tem pouco significado para mim, quem sabe o que dirão?



Com o vagaroso contato dos dedos, deslizo as mãos sobre a arriscada esperança daquele que parecia não acreditar ter mais no que tocar.



Peço aqui, perdão por fazer renascer em você a chama que quis com tanta força apagar.

Wednesday 18 August 2010

Things are now made of me

Se as motivações criam significado, há abrigo.

Ter demasiado apego à liberdade é que é estar preso.

O que os fantasmas de sua vida podem fazer que você não irá fazer consigo primeiro?

Teremos muito anos de calor e desejo entre nós.

Não há motivo para textos estruturados, desculpas, faces amargas; temos as luzes do dia, as luzes da noite, os sorrisos que desabrocham sem querer, bebidas esquisitas, fomes esquisitas, mãos quentes, mãos frias, mãos completas.

Acordo com uma puta sorte.

Monday 16 August 2010

Oh, my darling obsequious ghost

I could sing about the old ones.


but I won't.


É porque lemos uma porrada de dor, de indignação, de desprezo, de miséria. É porque estudamos filosofia, antropologia, história, caçamos blogs de música, é porque lemos Neruda. É porque ouvimos os sambinhas cansados, os darwaves macabros, é porque cantamos esse amor que temos medo de viver, enunciandos essas palavras que não compreendemos mais.

Se escrevemos cartas, falamos de saudade, alguns de nós nem têm duas décadas diante dos olhos, mas morrem de saudade, pedimos desculpas, esbarramos na multidão de nós mesmos.

Assim percebo quando começamos à tarde, porque a tarde se espreguiça arrogantemente em nossos braços. Observamos um ao outro, lentos, urdidamente distraídos. nossos grandes amores passados foram derrotados. Quando nos beijamos, esquecemos o furo que fizemos no mundo, as ruínas que pintam o plano de fundo dos dias dos outros. Não temos pátria, ideal, soldado ferido a que salvar. Nosso desejar e amar um ao outro, aquele com o rosto bem próximo ao nosso, é quase apocalíptico. Os números aumentam e nem conseguimos dissimular essa fissura inexplicável.

***

Kundera estava certo acerca da lentidão, mas a sua geração sabia caminhar, mesmo que fosse um caminho na merda. Por que a nossa se arrasta nessa lama, se afasta, desenterra o passado e faz ridículos esqueletos de castelinhos de areia toda vez perto demais da água, por que se continua com as mãos vazias?
Não sei o que há para tentar, para construir, que filhos teremos? Filhos de nós? Nós, esses cadáveres dançantes que empilham as ruas com seus sonhos?

Desprezo toda a minha geração.

Odeio as suas ambições medíocres, suas mulheres amargas, carentes, atrizes, seus homens egoístas e infantilizados, meninos montados em frases de homens mortos, homens podres e mortos, acima de todas as outras, odeio a gargalhada estridente perturbando as nossas noites, aquele desespero seco de quem nunca sangrou.

Não tenho orgulho de meus méritos acadêmicos ou de participar do frevo de bêbado que são as nossas instituições federais, com seus fósseis de livros, seus pensamentos datados, que forçam um bando de desgraçados a se prostrarem em fila indiana a cada duas horas, todos os dias. Só o que vi foram egos inchados, brados e gesticulações brutais, o giz descendo o quadro como uma navalha e ensinamentos que não tiram a minha cretina geração desse estado semi-cerrado.

***

Penso em meus amigos queridos, mortos ou vivos.

Digo aos vivos: não é a minha intenção pisotear ninguém, não é que eu não saiba amar ou retribuir, mas agora... agora morri, bem aqui, morri graciosamente debaixo deste sol e lhes deixo tontos. Ao final do dia, meu corpo morto jogará os livros no chão, inválidos,

 perdão, perdão,
        darei-lhe um beijo para a sangria estancar, precisarei de um café, dois, chorarei o silêncio que atira no escuro para atingir o próprio coração. Ouço Cartola tentar, "Deixe-me ir, preciso andar. Vou por aí a procurar..."

Nós somos os mortos da noite, mas

sozinha ainda procuro a saída dessa festa escrota.

Wednesday 4 August 2010

Experience

Fuck you and your pain. Fuck me and my pain. fuck me in my pain.

Coloquei o primeiro cigarro na boca aos 8. Nem tossi. Decepcionante.

Aos 6, experimentei o salto fino da mãe, número 36, vermelho. Caí depois de 2 passos.

Quase me atropelaram. 6 anos. Quase quis ser atropelada. 15 anos.

Já tentei os óculos de todo mundo tentando ver o mundo de maneira melhor, menos turva, talvez.

Empilhei livros e carta desejadas sem saber por onde começar.

Chorei ao ler um conto em uma prova de português na terceira série. Como o tempo vai...

Vivi. Desejei a cadeira de dentista que vi à venda em uma loja, uma viagem para o fundo do mar, o cavalo marinho da galeria no centro, desejei morte por afogamento, perfumes caros, sorvete de morango escorrendo pelos cotovelos. Não consigo mais saber o porquê.

Caminhei longe querendo não encontrar.

Digging holes. Now, that takes a lifetime.

Algumas pessoas bebem água até vomitar, pensam que pedras vão lhes assassinar, preferem se jogar na frente de um caminhão a ficarem gordas, choram em filmes de comédia ou em propagandas da Polishop, tem medo de partículas de poeira dançando soltas no ar da manhã.

De que adiantar contar os números, agora que não param mais de aumentar?

Explicar o que há? Neeeeem, posso ser o osso selvagem que ainda teima em desmembrar o universo. Está tudo bem. 

Isso não é uma confissão, um conto, crônica, um pedido, é apenas o que me serve para viver aqui.

Brasília é mal iluminada, você sabia? Não, não preciso de gelo, ah, no chão está bom, olha, quero voltar, quero ter mais tempo para ensaiar. Dizem que não se ensaia fuga, mas porra

o que as pessoas sabem?

Tuesday 3 August 2010

Everyone you've ever loved

"Please never leave, because I love you so." "I don't care about your feelings, I love you." "You can't keep touching him, I love you, it hurts." "I'm afraid to love you, girl. You're gonna break my heart." "You are looking better and better everyday, you are a keeper." "I don't even know her name, forgive me." "We are young, let's make a promise." "Girl, I will never be able to look at you without thinking: mine." "I only came, because I knew you would be here."

Love has teeth, they say, love has bones. Love is stomach acid, love is pumping polluted blood into your brain each and every day, love is wrong, love is screaming into the night, barking, howling at the moon, bumping into trees and stones, it's a punch in the face, love is no, no, no, love is yes, love is more please so much more, a lack of breath, love is salt, sea air, a savage twisting pain that won't let you sleep ever again. It thinks of you when you are away and when the sun goes down and love can't find you, it cries out inside wondering why can't you understand.

Nobody ever taught me how to love. My mother believes that love comes from driving you around town when you can't stop crying, it's letting you lock yourself away for years in your room, because life is too big, it's too small, it's letting you let everyone down, for her, love is gone; it has jumped over the bridge and let itself drown. For my father, love comes by mail, love is screwing the secretary over his working desk at lunch hours, love is to sleep. My late grandmother believed that a bum, a preacher with a beard loved more than all. My friends believe that love is a song filled with lies and cheap guitar solos from an old trying-too-damn-hard-band, probably sellouts.

I am loved, that I know. I'm kissed until I'm out of breath, there are these wounds on my neck and knees as if I belong somehow. I wonder,why does it keep telling me things, wanting me back, begging for more?

I am as old as the sea; there and back again. I have all these words inside of me, all these songs and memories, all these wild things.

I am I am I am embraced so tightly sometimes, what is going on?

All my lovers scream I LOVE YOU into my face, like a curse or a threat, but they never know how.

There is a me inside of every you. Could this be love as well?

Saturday 31 July 2010

Let it happen

palavras, ha ha ha ha ha ha. nós, as pessoas caladas, fazemos odiosos escândalos pelos corredores, abrimos as portas bruscamente e elas rangem, relutam em nos permitir passagem. nós, as pessoas falantes, ouvimos músicas histéricas de madrugada, talvez para calarmos a boca do outro, para ignorar o fruto podre de nós mesmos, talvez para esconder que não há nada a ser dito. verbos, substantivos, adjetivos, olhares demorados. nós, as pessoas constantes, abrimos espaços, abrimos as pernas, andamos bem rápido com nossos passos trôpegos, abandonando cinzas, rastros, nós desbravamos as fronteiras das ruas, invadimos a noite como se invade uma puta viciada, virgem, e fazemos isso exclamando AMOR LIVRE (um ator que improvisa sentimentos quando a cena dá errado), sem qualquer remorso. nós, os inconstantes, escrevemos, acreditamos nessa loucura forjada que precisamos ter para não enlouquecer, acreditamos nas palavras complicadas, nas rimas, nos dedos que deslizam sobre o papel, nas divagações a respeito de um século que se perdeu. nós, as mulheres, amamos, pois não sabemos amar, a princesa da disney nos disse para esperarmos no bosque, caminhando e cantando em notas tão altas e incompreensíveis que nem o mais sagaz dos pássaros consegue alcançar, nossas mães queridas, louváveis, traídas no passado, abandonadas no futuro, com suas vozes esganiçadas de preocupação, nos dizem para aprendermos a nos respeitar, vagabundas não merecem ternura, a colunista da revista feminina nos disse para trairmos nossos amados, nos masturbarmos de luz acesa para o vizinho do prédio ao lado, comprar 3 gatos, viajar para a índia, tentando nos encontrar em meio aquela porrada de gente, rios poluídos, jóias por todo o corpo, como se já não estivéssemos em todo e qualquer lugar, fodam-se as mulheres que não entendem a violenta delicadeza do que é ser mulher, mas sei, deve ser lindo olhar um céu de sábado recortado por nuvens e vê-lo abrir-se e despencar, e por alguns meses, alguns anos, se permitir acreditar que há motivos. nós, os homens, não amamos, pois amamos demais, não sabemos porque amamos cuspir, esbarrar, quebrar copos, chorar, escapar, beijar pessoas sem rosto, sem gosto, sem retorno, não sabemos porque escrevemos já que nem somos lidos, não sabemos, como homens, nos levantar após cairmos em seu nome, em seu corpo tão sofrido, todas as nossas criações humanas, nossas penetrações urbanas, nossas alianças de compromissos que esquecemos na mesinha de cabeceira do motel, todas as festas estranhas que vamos para não dançar, só beber, não tocar em nada nem em ninguém, não conseguindo esquecer o ontem, mesmo quando fingimos não ser assim, nossas pilhas de livros e explicações vazias, nosso ciúme que se converte em úlcera, nosso martelo, lápis, giz, nossos ponteiros infinitos, tudo para não amar. pena, nós homens, mulheres, bichos aflitos, amamos de novo e de novo e de novo. Errado, certo, distorcido, ampliado. confesse o que quiser, ainda amará. não confesse nada, amará. perdemos amigos e amamos de novo. cada voz faz o coração palpitar, não há porque se debater, seu estômago se retorce, você irá se afogar. por que ela parece não se importar? por que ele quer? por que agora? porque não antes? estamos juntos apesar de tudo, apesar de todo mundo. lemos merda demais. não compreendemos. não pensamos nas revoltas. nas vadias sem volta. nos meninos que atropelamos na estrada. cada aperto de mão entre nós é um pacto. eu, homem, eu, bicho, eu nadando e nadando nunca me aproximando da areia. você me ama. oh, ciranda maldita. não vai nos matar.

Monday 26 July 2010

ser amada é assim: desabrocha em um olhar, e não é nada do que é ideal ou o que seria ideal há uns meses. O antigo dono agora lhe observa de volta, é quase alienígena pensar que houve retribuição no fim das contas, mas você não sairá ilesa dessa nova emoção, e sabe, agora é um pouco difícil, o novo se lembra de você de hora em hora, te aperta em abraços febris e é bom viver, talvez lhe ame, pois há aquela fome que percebe em seu olhar, em cada balançar, e esse é só o começo, mais anos virão. Você sabe, viverá, mesmo que com anos de retardo, the bliding lights of your youth.

Sunday 25 July 2010

Gardening

ou O Terrível Encontro Com O Demônio No Jardim Selvagem.

Passou a manhã e a tarde a ler em um colchão mijado no escritório. Nada mal. Nem se preocupou em espiar a luz do sol, os dias por aqui são todos iguais, nem um relampejo de reconhecimento ao se deparar com os ideais antigos soma ao cotidiano qualquer experiência nova.
Por volta das 18hs, no entanto, começou a ficar inquieta, até que o casaco começou a lhe pinicar, - ok ok tá bom, farei algo para distrair um pouco o cérebro/estômago - . Lembrou-se do jardim, sua aparência decrépita, suas cores pastéis, e quando abriu as cortinas, lá estava: se a morte há de arrastar-lhe para algum lugar que valha após o golpe final, é para esse palco infernal que lhe traz.
Cenário patético, pensou, ao observar o jardim mal podado. Folhas secas por toda parte, frutas podres mofando no chão. Adora decadência - o imenso desespero, a morte que ronda, o mundo à beira do abismo, aquela sensação de quase-vida - , mas seus pensamentos têm nadado lentos, e esses últimos dias, talvez milênios, trouxeram-lhe a velhice e a velhice trouxe-lhe nada. Ainda mais, nada dói e nada mata, nem o amor mata, ora... mas que vida estuprada de merda. Nesse prescrustar lembrou-se da avó, então, decidida, caminhou até o jardim e ligou a mangueira. Atravessou os templos do jardim, e lhe pareceu imenso de repente, como o fora quando era criança; anos onde tudo lhe parecia imenso e incompreensível. Pensou como era revigorante perceber que agora que possuia o mundo ao alcance das mãos, não o desejava. Há momentos como estes, esta perda de tempo de tentar salvar alguns abacateiros e um punhado de gramado ressecado.
A tarde flechou-se nisso. Deu passos trôpegos do aqui para o ali, cantou o que se prometeu não mais cantar, cansou, cansou, volta e meia a mangueira esguichou-lhe a cara. Sentiu-se infantil.
Passo a passo, o espaço inteiro, o universo inteiro tornou-se mais como um abominável esforço, mas como por ora era valente, forçou-se a ir em frente. Garota, quem sabe tenha finalmente se tornado um mártir ou Sísifo como outrora sonhou. Ah, pedra nossa de cada dia.

Por uns instantes, prostrou-se ao lado de uma pitangueira a fim de ruminar vagamente os últimos meses com suas decisões e arrependimentos inconcretos, até avistar:
De início, pensou estar adormecido ou ferido, mas quando subiu-lhe a coragem de esguichar um de seus membros e o viu desprender-se lentamente do corpo como uma pasta gosmenta, decidiu: morto. Não sabia ao certo o que era. Deitado naquela posição de desamparo, poderia ser qualquer coisa, qualquer um, seus pequenos olhos covardes espelhavam o vazio. Desmembrado, tronco inchado, fétido, caindo aos pedaços, como um frango apodrecendo na pia da cozinha, como um gambá do mato esquecido. Sim, exato, um gambá do mato.
Agachou-se ao seu lado um pouco hesitante, pois a morte sempre lhe pareceu um pouco improvável, algo como uma piadinha do destido para lhe fazer mais prudente, ou ao menos, para lhe forçar a cruzar a rua só depois de olhar para os dois lados; para a vida doer menos. Ponderou sobre a imagem à sua frente conseguir dar-lhe um enredo, tentou imaginar o que uma garota como ela deveria sentir ao se deparar com um saruê morto e podre em seu jardim, ah, já faz anos que tem que se ensinar a sentir e a reagir nos momentos certos, pois mesmo um pouco trabalhoso, sabe o quão trabalhoso é ser tachada de maluca.
Agachada estava, participando estava e reagir demonstrou-se um esforço enorme, seria melhor talvez levantar ainda que com dificuldade, dar alguns passos para trás (confusa e distraída), virar-se, deixar a mangueira ligada ensopando a grama seca e um chinelo no meio do caminho na volta à casa.
Loucura não era, mas precisava pensar, quem sabe beber um pouco de leite, acender um cigarro, lembrar-se de seus mortos queridos, encher os olhos d'água ao pensar como as flores haviam se tornado escassas, do mesmo modo que suas vozes morreram na memória.
Acha difícil afogar-se hoje com o tanto de amor que tem recebido.

Uma culpa bruta invade-lhe o peito, os pensamentos voam... pois é, garota, foi-se o tempo em que pôde desistir de estar e ser em algum gramado da vida.

Tuesday 20 July 2010

If I had a heart

"... and I know you have a heavy heart, I can feel it when we kiss..."


Aos que sofrem por amor, uma baforada de cigarro na cara.


Chego à noite em casa e esbarro em cada quina, cada móvel mal posicionado. Veja bem, era para eu me irritar, era para eu xingar alto em frente à pia da cozinha vazia e escura e odiar estar viva. Devia me sentir comprimida dentro do corpo, cobiçando correr alucinadamente para fora daqui, amargar uma certa náusea de estar e tentar tatear as antigas rotas de fuga.


Deito-me no colchão florido e sem lençol, ai preguiça, encosto a cabeça em dois travesseiros fedendo a cachorro molhando, ai marasmo, um cigarro entre os dedos, um livro amarelo sem qualquer atrativo na outra mão, mas espiando o teto sou arrematada por epifanias que tombam em mim como orgasmos múltiplos. Meus pés formigam. A perna esquerda treme. Derramo algumas cinza em meu casaco. Encontro-me sem ar. Rolo de um lado para o outro, equilibrando parcamente o cigarro entre o dedo indicador e o polegar... até descuidar e me estatelar no chão, caindo com as costas em cima do cinzeiro. Dou risadinhas pateticamente femininas.


Não sofro de amor...


Em mim, há amor, sim, indolor. Sou cada dia mais amada, tocada, observada, nem dá tempo de ficar atordoada quando vem e me devora no ato, mal sobro para as noites e já nem há espaço nesse quarto para sofrer e toda vez a luz faminta da manhã incide sobre a minha cabeça.


Não quero entender.


Fodam-se todas as definições, reflexões, idealizações. Resisto a todos os planos e discursos, não conseguiria responder, de qualquer maneira. Certamente, não com esse coração na boca, sussurrando músicas indecifráveis e os olhos cravados no céu. Estou desconexa como em meus sonhos, como Rhoda e também diferente dela.


Só porque não consigo juntar frases e ter um parágrafo ou juntar fatos e ter uma vida redonda, não quer dizer que eu vá fugir dela. Então, que minha vida urbana, meus textos acadêmicos, o amor idealizado e toda essa porrada de merda - que o mundo inventou para nos manter ocupados e cansados demais para ouvir a voz selvagem que se debate no peito - , que toda essa escrotice datada seja engavetada. Sejamos selvagens, sejamos amáveis, amados, lutemos em nome do absurdo da vida. Você não precisa entender se já consegue sentir.


Vê se pára com essa cretinice de guardar o universo inteiro dentro da porra de um limão, esse seu olhar de leve desespero no cair da tarde já realiza um universo maior do que todas as notas idiotas que esconde dentro dos bolsos.


... levanto e caminho pelo quarto até conseguir bater a cabeça violentamente contra a porta; sou uma louca varrida, uma psicótica perigosa.


Meus joelhos falham e escorrego porta abaixo. Abro um sorriso.


Estou viva.

Wednesday 14 July 2010

That's the way it is!!!

Lixo pela casa e eu penso, ah, que mal há de fazer, algumas moscas, será?, focinho de cachorro se entretendo com os restos abandonados, você resurge inesperado, porque sempre volta quando acendo uma vela, às vezes duas. Evito o eu como quem evita aquele sentimento de identidade, de compor um quadro explícito, organizado e compreensível. E você diz para si, os dias fecharam-me as portas, digo que há sempre uma janela, mesmo no último andar há saída, mesmo nos dias de sol, sei que entenderá. Prometo em confissões confessáveis: escreverei quando tiver tempo. Tempo de espírito. E não atravessarei mais as ruínas desse dia podre, dessa cidade morta vaga indiferente. Não é nada disso que gostaria de relatar, tinha outra coisa em mente, mas aqui está. Irei me redimir eventualmente, quando parar de ler, talvez de beber, lembrarei das ideias, das palavras, de seu rosto tão marcado, tão animado, serei sã. Sonhará comigo. Serei sã.


Decido que deve haver algo em mim, já que não morri, nem a hepatite me consumiu, ainda leio livros, não consigo resistir, devo estar viva, uma angústia, uma chegada nunca partida, ainda tento aprender Khmer, francês, japonês, italiano, olho-me no espelho e não choro, escrevo sobre o mesmo banal de antes, recuso-me a divagar sobre o mendigo e sua garrafa de conhaque brasileiro deitados no meio-fio, uma linha marrom escorrendo até o boeiro, a ferida no joelho enlameado do menino com a mão enfiada pra dentro da janela do carro... dando sinal de vida, anunciando sua existência, seu retorno maravilhoso, o tapete sujo de merda, as cãimbas do cão, devo dar-lhe uma banana? Bebi demais e as obrigações acumulam-se. Compra-se comida quando se tem fome, não é? Lava-se a calça quando há mancha de whisky, pega-se o ônibus certo na hora exata e vive-se completa, não é mesmo? Ou melhor, vive-se repleta.

Repleta até a goela.

Saturday 10 July 2010

Little by little

Até o passarinho morto voou algum dia, e aquele que acabou de nascer, ah, quem sabe quanto céu irá cortar...



I've got so much to plant before I go e se eu conheço a solidão, já é muito. Construo frases, qualquer língua serve, não tenho frescuras ou ufanismos, descrevo em minha mente todas ruas da cidade, mas não sou a contadora de histórias que fui quando mais nova. É o que há de mais frustrante aqui. Estou mergulhada em distrações, internalizações, especulações, dúvidas, e nesse caos, ainda teimo em tentar explicar o incomunicável, os anos perdidos, os anos inteiros que vivo cada vez que olho nos olhos dos outros. Teimo em sorrir as luzes do dia e sobrevoar as da noite, e mesmo agora sinto a luz aflita da tarde a queimar-me a nuca, - em um ardor sofrido de estar viva, em um desejo irreparavelmente, inexoravelmente desejado - e penso que, apesar desses tempos sombrios que vivemos, sobreviveremos a semana. Garanto, já é muito, vezemquando, faço mirrados pedidos, quase que todos desatentos e eles debulham-se de mim, falidos. Saiba, isso é revolta. Não quero mais a chance remota, expectativas de um futuro brilhante, de um amor que irá me salvar, mesmo que eu acredite no amor e em toda a sua capacidade transformadora/absolutora/aniquiladora, não quero a salvação, tampouco me esquecer em algum canto para o qual não sei retornar.



Ainda é difícil, o orgulho me engasga as palavras... Passo a reviver certos detalhes, enfim demonstrar algo além de mãos vazias e olhos presos no horizonte... Ontem, arranquei uma lima-da-pérsia do pé e a atirei no abacateiro ao longe, tão longe, lembrei da necessidade de velocidade da minha geração. Pensei naqueles dias, todos os dias, eternos e imutáveis agora, em que fiz planos para ter um caminho a que seguir, quando deveria ter percebido que seguir é o caminho. Lembrei de você correndo para atravessar a rua, quase que dançando um tango da morte por entre os carros, só para chegar ao outro lado mais rápido, meus parabéns, guri, ganhou três segundos de vida e o que fará com eles? Esperará até eu conseguir atravessar, e desculpa a demora, ando perdendo-me no som das águas internas que rebatem em mim e destroem o mundo em volta. Velocidade para quê? Você não parecer viver, só vive de correr. E eu? Dou vaga atenção àquela antiga frase borrada, escrita na primeira página do diário do adolescente melancólico, "Estou apenas procurando me encontrar", pois acredito piamente que as pessoas, afinal, procuram somente (imediatamente/letargicamente) ser encontradas.



E é assim, eu num tropeço, você num sobressalto, que nos encontramos de novo... no chão, nas linhas em branco, nos corredores da memória atenta, ahhhh, de tudo isso, confesso: há coisas que nem os disfarces podem ocultar.

Wednesday 7 July 2010

Ressaca da maré

Meu avô foi marinheiro. É sério, cruzou a costa do Brasil da cabeça aos pés, é possível que tenha uma família diferente em cada porto que parou e, certamente, ouviu e se comunicou em mais dialetos do que muito doutor em linguística. Conto isso, porque uma das imagens mais nítidas que tive de marinheiros na infância não foi a dos navios, das velas, dos containers ou de homens tatuados, curtidos do sol, cuspindo e bebendo, mas sim, de suas esposas. Ah, você sabe, já deve ter visto em histórias antigas, em livros do Jorge Amado, talvez em alguma pintura ou desenho animado: um final de tarde no porto, o horizonte engolindo um dantesco sol alaranjadado e uma moça prostrada no cais ou na beira de algum promontório, cabelos soltos ao vento, lágrimas nos olhos, uma preçe nos lábios e um lenço úmido apertado nas mãos, esperando esse alguém que lhe prometeu o mundo e se jogou no mar.
Imagino se minha avó foi uma delas, nem que tenha sido uma versão mais recatada delas. Quem sabe sentiu-se reprimida pelo escarcéu da gaivota e foi para casa degustar a própria dor e esbarrando as mãos nas cabeças das esculturas de santos que mantinha em cada canto da casa, arrastando as chinelas pelo corredor escuro, acabou na cozinha gemendo baixinho em frente ao fogão à lenha e pôs-se a fazer a janta para um prato só. Seja como for, não serei uma delas, não lhe esperarei no porto que guardo em mim, não espere oferendas à Iemanjá, velas em frente à estátua de São Nicolau, tampouco oferecerei noites em claro, um sorriso doído no canto da boca ou olhos opacos de tanto chorar.
Mas é claro que cuidarei de suas feridas, até as cicatrizadas, até as incuráveis, serei como uma enfermeira cega e minhas mãos como água quente a deslizar sobre seu corpo febril, serei muito bela, ágil e gentil, sorrirei lentamente para você nos dias em que chegar cambaleante, soluçante, tonteante, o chamarei de querido com um beijo, ouvirei suas lástimas sobre a falta de sentido do dia após dia após dia após século no mar. Somente não se esqueça, posso até querer menos ausência, incoerência, imensidão azul a me perturbar, mas por mais que eu queira um pouco mais, nada peço, nunca mais.

You run, rabbit, run....

Sunday 4 July 2010

Graceful in the morning light

Eu não sou bonita, falta-me aquela graça que percebo em tantas garotas. No entanto, tenho um rosto lindo e delicado pra você, porque você me ama. O amor é a machadada certa que suaviza todo e qualquer engano.


Quero que entenda, esses beijos vazios nessas noites vazias não irão lhe consolar. As quedas na realidade deixam apenas hematomas, uma certa náusea em ter que suportar o próprio corpo, e nenhum lábio, nem os que soletram as palavras certas, olham nos olhos como eu olho. Tente não se desligar de si. Tente não se entorpecer. Tente não se jogar de costas e partir a espinha de vez. Tente não voltar a hábitos de tempos remotos. Ser jovem, estar vivo, é tão mais do que isso.


Cantarei enquanto você se retorce na cama procurando um lugar para aportar, sonharei com longos braços retorcidos de árvores a me abraçar, quem disse que não se pode ser feliz nunca mais?

Saturday 3 July 2010

Your veins are blue

Sou bem possível e a aparente angústia que lê aqui é só a droga corrente que derrubo garganta abaixo para me manter sã. Estou bem acordada agora, e não, essa visão de que estou encalhada entre as pedras e de que tenho medo de mudar, não é real.

O menino que desce as escadas correndo e, tropeçando no cadarço solto, esfola o joelho e as palmas das mãos, os caminhos que se encontram e se descobrem quando se caminha para ir ao centro ou se dá um retorno na rua errada, o pão e circo que foi arrancado das pessoas que vagam pela rodoviária agora que os jogos acabaram, a segunda que era um domingo e desabrochou em terça, eu girando e girando na cadeira e prendendo a respiração para não vomitar, os olhos que nos faltam e sempre faltarão, a constatação de quão sem propósito é ler este livro, concluir este trabalho, mandar este texto, atender àquela ligação, tentar desviar o olhar, a vontade de desistir de tudo e começar de novo para desistir de tudo e não entender mais nada, a confortante constância (como sinto falta em minha vida) das ondas do mar, as linhas de veias interligadas sem fim à minha ideia de você, isso é real, tão real que, às vezes, encosto a testa na porta da geladeira, fecho os olhos, me abraço em um aperto febril e penso coisas aleatórias como "goiaba", "haizara", "these are the memorials and pledges of the vital hours of a lifetime", "tempo, tempo, tempo", e tento ser um pouco menos, tento não imaginar nada além.

Compreendo o cansaço a indecisão a fome dos homens a embriaguez redentora e isentora como abro as mãos abro os braço e ofereço um pouco de mim ao mundo. Acontece, rapazes, que chegou a hora de compreenderem que minhas veias também são azúis.

Friday 2 July 2010

What about what I need?

How will my story ever be told now?


One light goes off, then another and another and infinite and beyond, I don't think I will ever understand.


Pouco me importa agora, já tão tarde, já tão embrenhado em mim, o quão pouco poético, o quanto irei estragar minha forma de escrita, as espectativas dos outros, seja o que for que colocaram em um pedestal a meu respeito, o quão adolescenteburguesabêbadachatarepetitiva eu vá parecer. Posso dizer, já li sobre isso em um livro/blog/direct message/e-mail/carta/correio elegante, já ouvi falar sobre quando os outros resolvem com um banho quente, bebida destilada ou sexo com desconhecidos, eu não sou assim. Doe-me admitir tanta coisa e o 'eu não sou assim' é o que limita e doe mais. Não posso ser essa ideia que tem de mim, tá difícil, entende? Outra coisa, é perceber que ao tentar girar na roda que gira e gira até você vomitar da vida pra fora, descobrir algo que me inquieta durante as tardes e noites em que me encontro só; sacrifico a mim mesma muito mais do que os outros.


Você pode cansar, desistir, dançar e se enroscar em outras ou em em outros, ser patético, o que eu quero dizer, ah, que bem irá fazer?



Como é insuportável, você nem se importa, mas como é insuportável, ter que me desviar das horas até o momento em que o dia tropeça e se espatifa em noite para que enfim eu consiga me dilacerar cega, absolutamente estúpida, tentando viver no agora, no tudo, mas tendo que me condicionar a viver no nada, sem ter ao menos o meu coração me esperando na esquina, e por quê?



“Cruzo o rio, é já quase noite. Vejo esse poente como o desbotar do último sol. A voz antiga do Avô parece dizer-me: depois deste poente não haverá mais dia. E o gesto gasto de Mariano aponta o horizonte: ali onde se afunda o astro é o mpela djambo, o umbigo celeste. A cicatriz tão longe de uma ferida tão dentro: a ausente permanência de quem morreu. No Avô Mariano confirmo: morto amado nunca mais pára de morrer.” Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra – Mia Couto

Tuesday 29 June 2010

Twitlonger moment

In my heart, everything is possible. And it's beautiful and nothing like it's now. I can't sit still and wait for you to change your mind, my heart is a big, fat turnit and my season has arrived.

Bem, manolos, raramento saio daquilo que gosto de chamar de "the black veil of poetic prose". Ora, mas hoje foi o bendito dia maldito em que acordei objetiva. Ok, acordar não seria o verbo correto sendo que nem dormi. Então, isso quer dizer que será confuso e mal escrito por aqui, boa sorte. What else? Chorei feito uma puta o dia inteiro. Estava bêbada se lhes interessar saber. Pois bem, foi algo de fenomenal, quase que uma maratona, e com certeza, bateu algum record pessoal que eu nunca quis ter; chorei enquanto queimava minha já acidentada pele alva debaixo do sol, chorei em frente a um ipê rosa e depois em frente a um amarelo, chorei no ICC norte, chorei no Ceubinho, chorei comendo um sanduíche, chorei quando o deixei cair no chão, chorei na aula de linguística e por aí vai. Seria de dar dó se não fosse tão patético. Tenho várias motivações, mas estou letárgica demais para poder enumerá-las direito. Só posso admitir aqui, amigos/inimigos anônimos, um dia desses, terei que me expor, terei que voltar a superfície, ninguém pode ser tão densa, mas é que tenho completa aversão à pressões externas na hora de tomar decisões, especialmente, decisões que irão mudar todo o rumo dos últimos meses. Talvez o maior problema é que sempre peço paciência às pessoas impacientes. Mas que diferença faz a minha opinião? Sou burguesa demais para ter tristezas e insatisfações genuínas. Se eu não for cuidadosa agora, acabarei por me entrevar... sem qualquer possibilidade de retorno.

e assim me esqueço qual é o rumo do dia? Estar indo nunca fez qualquer sentido para mim, considero estar algo estático, então como pode-se estar a caminho? O que viaja sem mover-se? O correto para mim seria 'foi-se', foi-se a caminho.
Penso em flores e como seria recebê-las e amassá-las até morrerem secas junto ao meu peito. De alguma maneira, esse deve ser o jeito com o qual lido com o amor, só não posso dizer ao certo, as pessoas me escapam por entre os dedos antes de me permitirem amá-las. Sei que não sou mais como Sylvia Plath que ao receber tulipas vermelha, agonizou em seu leito por não conseguir se levantar para rejeitá-las. Levanto e crio um altar para elas, e por algum motivo, esse altar se mantêm oculto aos olhos alheios e todos consideram que sou incapaz de montar um. Então, não faço nada. Sofrimento bem burguês, sabe. Fico parada, tremendo de medo, olhos vidrados de emoção, esperando a próxima queda. Livre. Quem sabe onde cairei? Quem sabe pra fora daqui?

"Pois parece assim. Uma maldição. Para sempre. Só acaba quando amputam os pés da moça. Quando você perde um pedaço. Quando você se anula." - Caio F.

Wednesday 23 June 2010

A golden heart

From time to time, I let it fade from my sight. I pretend it doesn't rip me apart to not make a single attempt to retain it, to get it back to me. This has always been the case.

I'm only trying to protect myself since I have nothing to go back to, unlike you.



É mentira que eu não quero, quero sim, mas de que me adianta querer?

Monday 21 June 2010

Who will put flowers on the flower's grave?

As amoras pego do pé ainda vermelhas, é que tenho pressa, sabe. A fleuma não é para mim. A maçã? Espero que já esteja cortada no prato. Quando à noite chego em casa... quero um banho longo, quero meu chá peach'n'passion fruit esperando por mim.

A problemática da idiossincrasia é não ter como explicar que seus dedos são curtos demais, suas mãos demasiado pequenas, sua boca selada, não há como carregar a dor dos outros ou distribuir a própria dor aos outros. Cansa tanto ter que dizer que este corpo me aperta, que esta mente me oprime, que estou enclausurada em mim, eu, déspota de mim, eu, serva de mim. Como explicar que dormir é um amigo ausente, que a biblioteca é a minha igreja e que meus deuses sofrem muito mais do que eu? Seus nomes ecoam eternos, suas vozes esgotadas, seus amores lembrados e esquecidos... é uma pena não haver uma luz, apenas um sorriso dúbio no final do túnel. Quem proteje os nossos deuses? Quem os salva de si mesmos?
E nessa de que a vida já não anda e de que nada cede, de que nossos deuses estão em frangalhos, meu tema será 'escolhas'. As forças cósmicas são arbitrárias demais, e por vezes, ocultas demais; seus códigos me atravessam sem deixar rastros. Como hei de permitir o cosmos me guiar dessa maneira? Prefiro você, parede minha, my reliable source. De mim nada sei, por isso espero por você na esquina, aquela perto da padaria, que esquinas, guria, olhe em volta, esta cidade foi recortada bruscamente por você no ano passado, triângulos malditos, pedaços perdidos rasgando o calcanhar dos desavisados, não se lembra?
Ok, então escolho os descampados. Esta é a cidade das sobras, afinal, de tudo que só se vê de longe, capaz de exaurir todo pensar, lembrar, ir atrás. Esta é a cidade onde o tempo morreu, mas ainda tenho pressa.

Monday 14 June 2010

Letters on thrusday

Dear old friend,



I've got confessions to make: I can't sleep. I can barely eat. I can't not care. I can't let go. My dearest, my dead dear one, my perpetual incanpability to breath, all the words wasted away, all the moments we've missed, all those dead dear ones oh, my heart...



Pobre de ti, amigo. Reconhece-me e vem atrás quando passo, mas não te passo. Acendo uma pequena vela, trago energia para dentro. Deito-me na grama, no chão, na calçada, em seu colo tão sonhado e não sei ficar ali. Não sei viver no agora nem no antes ou depois, sinto que não reconheço mais o tempo. Escrevo aos milhares sobre ruínas, árvores e mares, essas coisas misteriosas que não cabem em mim, essas tolas inanimadas, lascas de realidade vã que desviam o que não consigo dizer, pois não consigo saber ao certo o que saber. Resguardo-me em meu passeio interno e sei lá, aposto que você, se fosse vivo, saberia o que responder ao receber tantas ofertas, jogos, desejos, promessas, noites, rejeições. Eu? Não se dizer, não sei onde estou nem aonde estou. Entendeu? Está entendendo? Espero não provocar distâncias, decepções e angústia entre nós, já existem tantas barreiras entre nós, criamos uma realidade paralela inteira coroada de abismos e obstáculos e para quê? É por que estamos exauridos, derrotados, entendiados a ponto de passar por cada espelho e desejar ver outro alguém? Nos observamos prostrados um ao lado do outro, eu mais viva do que morta, menos morta que você... por que não mais conseguimos comunicar ao outro a bandeira da revolta, o hino da guerra ou do amor? Ou seria porque estamos tentando desencontrar o que já encontramos?


Dear old friend, dear dead one, what else can I give that have not been given to you before by the many yous/hers, by the many forgotten names and faces with bodies with fingers that touch and pull? What else do I sacrifice in the name of whatever is this thing we have? The ship is out in the open sea by now, there's no going back, pleading for mercy, praying for storms, german submarines or icebergs. Você, minha falta de força de vontade, minha febre terçã, tem que entender que lhe defino por vários nomes e explicações, pois não sei mais a quem escrevo isto aqui. Você viveu um sonho de verão que lhe definhou. Eu nunca vivi antes de viver agora. Tenho que perguntar como as pessoas fazem as coisas, pois não sei. É fácil para você, um morto, controlar tudo que eu faço, quanto devo sentir, querer, demonstrar, não terá que viver nada disso. Sou aquele botão de uma flor cujo nome ainda será escrito, sou o início do início do início de nossa história e nada posso fazer para me defender de todas as mutações, laços e verões que surgirão de mim. Você não pode impor o quanto me é permitido existir já que nem existe. Então, espero por nós naquele banco ali, e quando você chorar, dormirei para o outro lado para não ouvir. The dead, even the dear ones, have to know when to be forgotten so they can be missed again one day.


It's never ever over and so... it begins.

Saturday 5 June 2010

Mother of all






Não é compreensível que esteja no masculino, o mar nunca foi um pai, o pai é aquele que só se vê no final da tarde, que lhe manda terminar a sopa, que lhe presenteia com palavras e distâncias, nada que se possa usar no mundo em que vivemos, que rispidamente lhe mandar parar de chorar enquanto ele mata o filhote de gambá que achou naquela gaveta em sua casinha de ferramentas.



A mãe te embala, te embalsa, lambe as suas feridas mais enraizadas até arder. Vi quando ela chorou, naquela selvagem maternidade de ser, ao ver sua filha encalhada na areia. Era imensa, essa filha, havia sido bem sanada, nutrida, embevecida durante anos, mas era obtusa feito um pepino do mar, o filho ingrato. Ficou enfeitiçada pela irreal solidez da terra e acabou sepultada lá. Sua mãe, tão fraca de chorar, tentou em vão usar suas fracas garrinhas de espuma para trazê-la de volta. Ai, mas como o tempo se faz irreversível, (en)torna até o mais esplendoroso em irreconhecível.



Quando jovem, não pensava em mim como filha também. Imaginava-me em outro corpo, nada prendia a minha atenção, sonhava em ser da superfície das coisas, pois era tudo tão mais claro. Não ser a encalhada, a baleia morta, o mexilhão cravado na pedra, água-viva boiando em oblívio.


Certo dia, uma gaivota riu e percebi o meu reflexo. Que reflexo, pergunta. Não pode-se fugir de si, saiba, tentei, morri e engatinhando voltei. Não se pode negar as águas irriquietas que brotam de você. Pesa-me admitir que faço parte de um universo que não criei, que não pedi, do qual jamais poderei escapar, mas aqui está: sou uma onda, aquela que se quebra na praia, e estalando, é puxada pelo cordão umbilical de volta pro mar.



Veja-me reconstruir, ter de reconstruir minha vida, dia em cima de dia, e talvez entenda. Você não está lendo a mesma pessoa de ontem, não adianta apontar na minha cara e me dizer que entende, que quer muito, que não quer nada, que não sabe o que querer, aqui está alguém que vive o absurdo de explodir em sua frente em nada! Fodam-se os seus delicados desejos juvenis, garotinhos, perguntem à gaivota sobre a leveza, a superfície. Aqui, ou você vai com a correnteza ou é devorado pelo mar.




"Is it the sea you hear in me?
Its dissatisfactions?
Or the voice of nothing, that was your madness?

Love is a shadow.
How you lie and cry after it." - Sylvia Plath

Wednesday 2 June 2010

The dead of the night come together

Darling, it's only when you give up that things start coming your way. When people try to tell you what to do, you'll say, "You see, I know the connection, I have to admit, I feel it burning in my veins. So does he." He fears you are over it, but you'll never be over it.



You know hope is death. It's dead and gone that old one, sure now it's the same but you both have changed, that's why he finally understands you and now desires that whole ordeal of blind desperation you've had for so long. Girl, it's you that do that do that do.



Lover, I don't have to love. Ex-lover, you do.

Saturday 29 May 2010

The Purple Rose of Cairo

Na verdade, a cortina é um lençol, essa é a verdade.
É amarelo, cor do inferno, do inevitável. Quando a luz da manhã ali incide, a parede mancha, o chão desperta seu lado ocre, a cor dos olhos, das emoções, ai que tormenta estar ali, o rosto esquenta, mas não é feliz. Esta mancha, cusparada de âmbar, traz consigo tantos sons que é impossível evitar o nó na garganta quando eu, esticada na cama, ouço os talheres, a chaleira chiar, os galos, motores de carros, passos pela casa. Aperto os olhos com força e penso estar na rede, naquele final de tarde de janeiro, intoxicada pela lenta maresia de uma vida que já acabou.

Foi-se o tempo.


De hoje o que entendo é que tenho um jardim que não é meu, tenho esses frutos que apodrecem enquanto caminho tonta para longe. Tenho você que me quer tanto quando já nem sei viver em mim. O que acontece é que ele colocou as duas chaves no chaveiro tão perfeitamente, tão espontaneamente, que não podemos mais romper esta fome, esta dor, este círculo que é o nosso miserável destino, todo obsessivo e redondo feito um tumor moldado em ferro, moldado para nos ferrar.


Estou confusa, hipotérmica, ironicamente febril, rígida e psicótica, quanto a isto e aquilo e tudo e mas que porra é essa que me faz contar os minutos com as pontas dos dedos, dedilhando melodias tribais nas bordas da mesa? Mal diferencio quem é ele ou ele ou ele ou o amarelo que me invadiu esta manhã e me desmontou. O amor não é um câncer, não acredito que cresça; é espuma do mar, e nem os deuses, nem as oferendas partidas na praia podem mantê-lo intacto em mim.

"I just met a wonderful new man, he's fictional, but you can't have everything".

Wednesday 26 May 2010

Somebody's done for

Tell me anything you want, any old lie will do, call me back to you.


Você você


você você você você você você você você você você se arrastou para debaixo da tenda tentando levar um tiro, mas com nem um soco te premiaram e desde quando falar grosso contigo surte efeito? Enquanto você se engalfinha nesse tango de merda que vai te cansar, te dar bolhas no pé, cascos podres no peito, sonha com as quedas, aquelas antigas estradas, ruas que doem em você quando afina a luz do dia.

Ele ajeita a blusa abarrotada e se curva um pouco ao andar, tentando assim parecer mais baixo. Ingênuo, pouco sabe como a altura lhe traz as nuvens, nós aqui embaixo vivemos de destroços, ruínas de emoções, até os mais antigos escaravelhos sentem pena de nós.


Quem sabe me acho um dia, na esquina do amor ou em algum abismo além do fim do mundo.

Wednesday 12 May 2010

Being sad sucks

Subi ao topo das ruínas do dia para ver o pôr-do-sol, essa dor é tão nova e tão exótica que me repuxa a pele dos olhos de modo singular, embaça-me a visão e desde então aprendi a enxergar com outros olhos. Sempre volta à noite esse insandecido sonho, por isso aqui espero. Minha concordância verbal e nominal é um não concordar com o estado atual do meu coração. Tenho tido medo do que penso e de minhas previsões absurdas, não entendo bem porque meus pedidos vem fácil, olho para o fechar do céu e penso, "Hermes tem corrido mais rápido para comunicar o que alucino através do dia, talvez", talvez seja o universo harmonizando depois de tanto caos.


Fiz um novo amigo e isso me dá esperança, vai entender. Esse deve ser o jeito.


Não há nada de somente platônico entre nós.

Tuesday 4 May 2010

Me dá uma secura

Tenho alívio da literatura que leio, não a compreendo. Sobe-me uma dor na espinha quando vejo pessoas caçando em livrarias, livrarias são para mim boeiros chafurdados de dejetos disformes da mente humana. Ser um elefante seria a paz, ser um peixe até, afundar-me no invisível, no impassível, no que é por não saber não ser.


Meu passado é da cor branca da minha ignorância. Não que eu mantenha a minha ignorância como um troféu de consolação como faço com o meu passado, só admito que essa ignorância vem de um impulso de não entender a vivência e poder ser leve, mais do que a incapacidade de entender. A única coisa que desejo mais do que tudo é enfiar as unhas na carne, ferver o seu, o meu sangue e sentir e não há o que entender aí, não tem explicação. Acato a tudo que meu insano coração comanda, soluço no escuro, rasgo com os dentes as cortinas e exponho o mundo aos bastidores de meus sonhos.


Você quer sim e me dá uma secura.


O que é o para sempre senão uma vontade de fazer as coisas parecerem sólidas?



Não, meu bem, não adianta bancar o distante: lá vem o amor nos dilacerar de novo... - Caio Fernando Abreu

Monday 19 April 2010

Pauses

Toda essa babaquice pseudo-literária aqui tem pouco valor, até para mim. Não que seja mentira, mas só me trouxe muita mágoa acumulada que não consegui exprimir e uma certa revolta. Falar abertamente é algo que desconheço. Talvez eu consiga me salvar quando parar de planejar ou me encantar.
Não tenho o menor desejo em aprender a funcionar do modo esperado e tenho pavor de qualquer tipo de responsabilidade. Imaturidade ou não, batuco um ritmo só meu e que em nada condiz com essa música diária que ouço pelas ruas, que ouço nos movimentos alheios. Tenho a vantagem de não querer me consertar ou consertar ninguém. Me aceito como aceito os outros, com tolerância e um certo desprezo. Admito que me sinto exausta, que não quero mais esperar e hesitar. Não quero mais ter saudade de mim. Muito menos ter que andar pelos momentos com esse suspense, essa vontade.
Desejo para os dias futuros aquela sincronia cósmica, a única que compreendo. Não quero mais essa quadrilha de Drummond a assombrar as horas. Desejo também, dias livres de indiferença, indiferença pra mim é doença. Tudo tem tão pouco nexo, por que não tentar mais? Mais ar, mais canções, mais ebriedade, mais palpitar, mais paixões loucas, menos limbo, menos desse abismo, desse cadafalso, dessa dor já cansada também, inexplicável e ridícula que me tira do rumo. Que venha a luz que me queima e sorrisos que não doem no rosto. Peço ao universo, aos astros, a qualquer coisa mais forte do que eu, mesmo que seja essa voz interior, minha musa inspiradora, uma recompensa e não me interessa a falta de merecimento, não acredito em merecimento, nessa valorizações moral das ações humanas. Quero paz, a mais confusa, caótica, entorpecente, dolorosa paz.

Friday 16 April 2010

I could care more, after all

Me encontro aturdida nesse divisor de águas.
É difícil abrir mão, mas me sinto livre, sinto toda a machadada pavorosa da liberdade. Isso sempre me acontece no trânsito entre estações.

O outono chega sorrateiro atrás de mim, as águas veraneias começam a diluir, a temperatura do banho muda, assim como a das frutas, das cores, dos sorrisos, e percebo toda essa mudança dos tempos como os antigos faziam, é assim: aquele vento cortante da manhã me diz, aquela vaga luz diurna que encobre a grama me diz, vejo, quando atravesso os caminhos do dia, as folhas das árvores se retorcendo, encolhendo, secando, parece que o mundo vai desabar. Este é o grito silencioso da natureza, anunciando a vida. Ou a morte. Para mim, o outono é um limbo, minha estação mais querida por ser a mais doída.
/\/\/\/\/\
Tenho o mesmo sentimento de confusão e inquietude quando escreve, mas percebi ter o mesmo efeito em você. É estranho afetar alguém. Palavras são corredores sem saída ou janela para escapar. Ficamos parados, dolorosamente angustiados, procurando nos outros o que os outros não tem. A sincronia do universo nos empurra para todos os sinais, encontros e estranhas coincidências, sei bem que eventualmente te olhararei nos olhos com alívio e não terei mais que especular. Esta será a nossa estação, o abismo sagrado de cada dia.
Até ali em diante, my friend.

Tuesday 6 April 2010

No innocence is known

Que coisa maravilhosa é... saber que você mudou, que o que era tão impenetrável em você agora é poeira no chão. Amarras não há mais, pensamentos obscuros vem e se vão como uma maré lenta, um sonho lúcido, um cansaço feliz/infeliz/desesperado/livre/compulsivo/redondo como um planeta, um limão, uma falta de ar, mas para que ar? Para que se preserva a alma? Eu quero dançar até o fim do século (ver a sombra do dia cair em meus olhos), quero beber todas as mágoas, quero ver demais, ouvir demais, ser um tato frenético ambulante, quero ser beijada pela pessoa certa na hora errada, toda vez perder o rumo, me debater de encontro com todos os estágios da vida. Que teima é essa do ser humano de estimar a inocência, a pureza, a leveza, casualidade e paciência como nobreza de espírito, julgar os outros por não as possuir sendo que nem ele próprio possui?


A chuva não te impede, a música babaca não te impede, a voz distorcida e estática ao telefone não te impede. Você passa a mão nos cabelos sujos, sorri baixinho essa canção corriqueira da noite, finge tocar piano na borda da mesa, não se apavora, não espera o animal acuado de seus altos pensamentos juvenis. A lucidez tem seu preço, mas não é nada que irá te matar.


Naquele tempo pálido-azul, quis ser sólida feito uma árvore e não sentir mais, em especial, não mudar, não passar pelo êxodo de vontades e ideias, ficar prostrada, morta, viva, inocente. Esqueci, tola... árvores também tem suas camadas, suas falhas, também podem se partir em tempestades.


Não há inocência onde houver o tempo, e eu? Sou filha do tempo, do tempo que perdi, que sofri, até desse tempo que é um vácuo branco posto em minha frente, the great unknown.


The world is full of beautiful things, but you have to walk to be able to see them. Então, caminho contra o vento, sem esperar mais nada, pois em cada curva da estrada... lá está.

Thursday 1 April 2010

I believe in symmetry

Bright, bright be my night!


Só passei aqui para confessar que a noite será alta, assim como já estou, sinto o universo dançar em sincronia com meu coração - cada minuto pulsa em minhas veias -, que o cansaço não é nada para quem está tão viva. A gente não precisa de uma palavra para se entender, a gente não precisa de nenhuma estação para se encontrar, o que importa é se perder, se esbarrar no ritmo selvagem que é ser jovem.


Nós, humanos, somos tão possíveis que até a nossa morte não passa de um rito de passagem. Bon voyage, marinier.

Tuesday 30 March 2010

Twinkle Twinkle little star,
Move from the outlandish universe
To grant my wishes for the night.
And from a million pieces
I'll emerge as one.


or perhaps two.

Tuesday 16 March 2010

Bálsamo

I'm going back to that place where I once lost my heart.

Acredito naquela tradicional visão de mundo com início, meio e fim ou talvez essa crença seja proveniente de um intenso desejo de solidez para a minha história já tão caótica. Meus dias tem sido sem um grand finale para me consolar. É como se eu estivesse em um estado o qual aprendi a chamar de "síndrome do sol da meia noite". Quando me aproximo do derradeiro instante, ele de repente se levanta novamente para me assombrar. Tento não pensar nas pausas entre nós. Tento descrever em frases longas o que estou sentindo, mas a cada momento do mundo parece que sou carrega para uma outra direção.
O que devo fazer agora? Me resignar? Aceitar essas segundas, terceiras amargas chances como algum tipo de prêmio de consolação por estar tão perdida? Queria muito ter no peito essa certeza de um destino moldado em pedra para me proteger de todo o mal (que me praticam e que cometo sem pesar), ao contrário dessa visão noturna que tenho de um destino como um fio de cabelo onde se pode dar nós e cortar quando bem entender só para me ver cair... e com que propósito, deveria haver propósito?

Apesar de tudo, aceito as voltas e revoltas, pois cada topada e ralar de joelho é uma página a mais.

Friday 12 March 2010

I'm prepared to do it alone

Blue light in my blue room, in the background, a blue rain cries out and wash away the afternoon...

Uma voz interior me inspira. Acordo sentada de hora em hora, tentando não lembrar. Preciso de uma prosa cansada, pausada, morta à pauladas, estirada no chão. Preciso de seu sonho legendário e a volta à semi-realidade.
Agimos como se desenhássemos a vida, vez ou outra olho para meus dedos manchados de tinta na ponta e tenho vergonha de quão vagamente reconheço os lugares, porque saio tão pouco, penso que a qualquer momento posso me dissolver no ar. Você vive em seu armado leito de morte, fraco demais para sonhar. Passo os dias conversando com plantas no jardim, lendo poemas sobre deuses bebendo em taças de vinho feitas de crânio humano, como uma velha reclusa, seus 7 gatos, recebendo apenas visitas de estranhos enganos e escondendo um terrível segredo do resto do mundo. Nada disso que fingimos é real, já devíamo ter nos acotumado.
Penso que se estivesse em uma daquelas noites densas, em um lugar tão longe que sem volta, perto de um mar escuro, o Cáspio talvez, com uma alma plena como minha luz, meu guia, poderia enfim me perdoar. Mas essas noites esses mares essas almas estão acontecendo agora e acontecerão amanhã e em todos os dias pelos século que virão, e só o que falta de mim é a cara de pau do primeiro passo.

Quem sabe sejamos mais do que meros desencontros à luz do meio-dia.


Walking about in Africa maybe, but thinking of me.

Thursday 11 March 2010

Between acts

Você me pede um pouco complacência, decência, paciência, e devo acatar? Quando pouco esforço fez para retribuir. Olh, não vou lhe curar a imensa dor que sente por dentro, caminha, infeliz.

A wave after the storm, I'll scatter all over the sea and hide myself.

O dia se arrasta quente e lento, você dirá. À noite irá me procurar para entender mais de perto, e sem perceber, pensará que talvez dê certo entre a gente, seja lá o que certo e entre a gente deva significar. O problema é que eu não concordo mais não.

Monday 1 March 2010

We drink to die

One by one, blue dreams come true.

Não há nada em nossa frente além da estrada, agora já dá para prometer, e toda a lentidão desses últimos dias de verão será deixada para trás.

Esqueça os desvios, daqui em diante o futuro é certo.

Thursday 25 February 2010

In the parkway of desire

A filosofia me atormentou durante toda a vida, é difícil explicar como a reflexão me desviou dos caminhos. Um momento estou a ser... o que tento ser diariamente, tomando sorvete na sala, arrancando fios de cabelo, administrando a vida alheia, mas no outro sou Emil Cioran afirmando que só continuo viva porque posso me matar a qualquer instante. Para não contemplar o abismo, escrevo secas frases abstrusas. Faço um estardalhaço, me empoleirando em ideias sem raíz, sem nenhuma motivação profunda, assim respiro.


Am I to die here,


Unaltered and alone


A rotten fruit on stone?


All dance and leave me here, mad, cold and weary, marred by sun by moon by dust to dust why did you leave me?


De abismo em abismo, tento deixar pedaços, laços separados da nave-mãe. Dói-me existir, ter que me apresentar nesse teatro do absurdo para uma platéia indiferente, dia após dia. Viver deveria ser a pura poesia que pulsa no ar. Essa cruel análise me separa, mas tenho centelhas de esperança aqui e ali. Quando eu voltar, quando me tirar daqui e eu não ter que ser mais tão absolutamente completa, um fantoche repetindo estrofes de deuses e homens pensantes, específica e certa como uma conta bem feita - triste diagnóstico. Quando eu for então, amada, apertada, desejada, serei um aquário quebrado, estilhaço de vida, ah, serei tão feliz.


Será que agora vai?

Sunday 21 February 2010

There and back again

Even children believe in love, so why can't you?
Sure, children believe in fairies and dragons and salvation, but then again, there's no shame in believing.
This reminds me of last night when I saw you flying across the sea on the back of a crow, the stars cried and washed your hair like morning dew, mermaids chanted your name into the night, a herd of black wild horses stamped your name on the warm sand and I smiled knowning that even though we're so far apart, our destinies are intertwined. I know you think of me, you lie to yourself but think of me while you carve my name on tree trunks, write me secret poems and letters, when you hide deep in the forest trying to stay away.

A name, a name I write, though I try to forget. I try to forge a new identity to it, everyday I try not to remember it just like you try to erase it. But it doesn't work, some things are meant to find each other, bump in the night.

I hope to find a new meaning and whatever love or hate that might come in between doesn't matter, we'll work it out. Thread on.

Friday 19 February 2010

Ease your feet in the sea

I've always been driven, driven away...

Foi um rapaz que durante anos viajou só. Disse-me que conheceu as árvores mais altas, os pássaros mais exóticos, comeu insetos asquerosos, furou a língua com espinha de peixe, escreveu mensagens de amor e ódio à beira-mar, respirou fundo toda a maresia, toda a fantasia louca de viver essa imensidão de ar. Encarava de frente o horizonte quando disse que um dia me levaria lá.
Disse-lhe que não o esperaria, deixaria a sua promessa em alguma gaveta, levaria a minha canoa para o alto mar, dormiria embalada pelas ondas, seria a rainha das águas, abençoada pelas estrelas com meu vestido de espuma e coroa de algas, cantaria doces canções para a noite suave, sonharia com cavalos de nuvens à galopar pelos céus, pintaria a minha pele com todas as auroras e crepúsculos e também estaria só na imensidão selvagem... do meu coração.

Nossos destinos se perderão, no entanto, pois no meio dessa tragetória, já não estarei mais só.

Thursday 18 February 2010

Paint the sun beyond the clouds

Ela também tem sonhos. Sei disso, vi a foto que guarda dentro do livro de auto-ajuda, vi pelo jeito que corre e rodopia através do dia sem propósito ou direção.
Às vezes também corro, desvios de certos beijos, certos olhares, não quero me envolver, me impressionar, não quero participar da roda. De que vale ter uma filha assim, escrava de suas emoções, corroída pela insatisfação, pela paciência. Meu futuro brilhante foi escrito e não vivido. Sentença definitiva de todo letrista; viver através dos dedos da falta da dor da lembrança de um sonho que não cabe no mundo.
Na tontura da fome, choro essa desesperança nossa, esse desencontro de momentos. Quando outros me esbarram, sempre sussurram em meus ouvidos em penitência, "Desculpa, pequena. Mil perdões. Te quero bem, me queira bem. Adeus". E é com isso que tenho que viver, por isso cansei. Não procuro mais a exatidão nos números, nos horóscopos, nos olhos, quero um encontro ao acaso, num dia de quase certa derrota, no da bêbado em que eu tiver desistido de ter, só assim terei de novo.
Meu sonho maior é ser uma pintura, observada, detalhada, copiada, adorada e nunca compreendida.

Tuesday 16 February 2010

Interlúdio

Sou pequena diante do amor, diante da náusea que me dá quando sinto que estou perdendo, a raiva que me dá sabendo que posso me congelar por dentro, mas basta uma meia dúzia de palavras para eu derreter de novo. Sinto tanto a minha falta. Sei que estou só, que não consigo pensar ou me aprofundar, que toda vez que meus dedos afundam essas teclas quer dizer que tem algo de errado. Ô, coração pesado, calma, calma aí.


Tenho pouco o que dizer nesses dias azúis, quero somente que a luz me arrebate de novo e que não mais me deixe no lado escuro do dia, tentando recordar.


... o caminho da sincronia e das águas calmas, do grande alívio noturno, é lento e cheio de sinais contrários, mas isso não quer dizer que não exista e que não indique o caminho certo. ei, a coisa sempre volta e direto pra você. Just slide.

Wednesday 10 February 2010

Cowboys

Curvas de rios vivos, desvios.
Pássaros cegos na luz da manhã e seus voos insólitos.
A solidão, meu carro-chefe, é que me trouxe aqui.
A morosa música que ouço ao longe
Flutua baixo ao despenca a noite
Em meu desfiladeiro abissal
Diferente das verdades que conheço.

Tudo é só. Um só.

Um só cavalo, apenas um sol acima de meu chapéu, um caminho, uma voz, talvez uma águia como guia. Minha visão, muito fraca debaixo desse fogo, dessa brancura crua, sem remorso, percebe a loucura de ser, mas não estar.
Dispenso as flores, as cortesias, as promessas. Meu espírito é frágil, mas a resolução continua a mesma. Frente à frente à frente. Sei o que sei e o que sobra disfarço em frases curtas.
Quando perder o medo do oceano que trago comigo - quando entender que não é um deserto que carrego, esse deserto apenas finjo que carrego, na verdade é um mar; nenhum cavalo nada ali, nenhum chapéu fica onde está. Sou um abismo da alma. -, entenderá que uma concha não precisa de pérola para ser jóia e que meu coração é pequeno, ah, pequeno o suficiente para guardar.

A coragem de cada sol levo no peito, até o fim do mundo.

Friday 5 February 2010

All saints are liars

Mentira mentira mentira alento... horas espaços universos abertos/lacrados estrelas pontos de luz luas faces lívidas peixes lentidão guelras sorrisos voltas revoltas desespero desencanto tantas santas curvas o mar que desliza e me rebate

Verdade verdade verdade uma canção fraca pede passagem.


Eu sei que é confuso; peço para, seja lá quem decida ler isso aqui, que acredite aalma de cada palavra, nesse quase dizer que já diz muito. Tenho saudade de você, mais de mim. Meus sonhos antes transitavam os alpes suíços, as densas florestas da Índia e do Camboja, ilhas gregas, Grand Canyons, pampas, castelos na Alemanha. Agora, sou o sonho de um sonho, sou o destino de alguém e não tenho como tentar fugir.
Meu coração tem a audácia de se entregar, eu decido remar ao léu por coragem, sim, e por falta de bom senso, até uma meio que rebeldia contra a realidade, afinal, o que há de real nisso tudo? Você de seus desvios sobrevive, quase não vive, quem sabe se é, pede desculpas ao vento, às paredes ancestrais e me ama em silêncio.
De um charme deselegante, uma casualidade deslocada, se diz indiferente, pronuncia meu nome pelo canto da boca, quase uma prece, possui todos os ódios do amor...
Sabe, precisa-se de muita confiança para ser assim covarde.

Tuesday 2 February 2010

Meet me in space

Deito-me no asfalto em plena avenida, um sorriso colado no rosto, os pés em direção às estrelas, a lua nua à espiar. Morcegos atravessam a noite sem reparar minha presença despencando aqui em baixo. Uma noite clara, exata, quase uma queda vertiginosa derramada no chão.
Lembro-me de casa, da piscina com seu cobertor de folhas, do gato solto pelo jardim, das músicas lentas que sempre embaram minhas noites quentes, penso em meu terraço, meu santuário.
Nada das coisas com as quais sonha, encontrarão você. Sim, você pode se esconder no coração das palavras, na neblina tonta desses dias úmidos. Pouco me importa. Ah, e diz não me ver, mas conheço toda a realidade por trás dessas frases rasas.
Eu? Também não posso lhe esperar, vou adiante onde um outro poeta me queira. Nunca podemos esperar ou nos desesperar, o cosmos nada espera. E as leis que sigo são tão antigas quanto as estrelas, talvez nunca compreenda.
Durante a noite, você galopa e volta para mim, veja, cometas como testemunhas, a lua a esmurrar contatos. Sonha com a noite como se eu fosse ela e com o quase quase quase que quase aconteceu.
Tropeço fácil e caio de quatro, o chão também é misterioso e escuro feito o espaço.

Wednesday 27 January 2010

Likely meant

I've been sleeping so strange at night...




Retornará ao ritmo moroso, pois o conheço.


Irá à estação a minha procura, mas perdão, descuidei-me no caminho, preciso tanto não encontrar. Nosso futuro é certo, quase óbvio, até as sombras do dia compreendem quando nos veem à tentar a dançar da separação, do nunca mais, mas nossos pés desobedecem os passos.


Assim iremos nos deitar na grama seca de agosto e filosofar acerca da vertigem de cada dia. Me dirá que sou uma queda-livre, não, não, uma estrela cadente com meus cabelos de fogo e direi que não sei o que você é, talvez o caixeiro viajante, o eterno vendedor de sonhos, que quase sendo sem querer, muda a vida de todo mundo, lua após lua.


Orbitamos em nossa atração absurda, mesmo quando não nos assimilamos, dividos entre o abismo que nos desuni e a vida que poderíamos ter. Um dia aí, me olhará e dirá, mesmo que de relance, que também se perdeu. Apesar de filhos da terra, nenhum de nós captura o orvalho da manhã.


Noturnos, nebulosos, sem nome, sem rumo, rostos falsos como o de um satélite, mas...


diferente das estrelas.

Tuesday 26 January 2010

O errante navegante

Se fosse no cinema, numa carta, sei lá, um cartão postal! viria de muito longe, eu apertaria a rosa (vermelha, polida, destoante) contra o peito, jogaria meu chapéu para o alto, seus corações palpitariam excitados ao ouvirem a trilha sonora que indicaria meu triunfo, e assim, os créditos subiriam em frente à imagem de um céu de nuvens nervosas, nuvens de uma imensidão intransponível, quase sólidas como a terra amarga que reje o meu coração.


É desse lirismo que vivo, vivo como se fosse de vidro. Se eu não me encarcerar em sonhos remotos quebro de vez. É a maldição, é a posição dos astros, é destino meu, é a lei do retorno ou qualquer macumba na qual acredite. Falta de sorte, amigos.


Tenho ainda a noite, as estrelas, tenho o leve conforto de estar sozinha e só ter eu mesma para me ver . Vocês precisam compreender isso: não há nada mais seguro do que abraçar o chão e sofrer.

Saturday 23 January 2010

The loneliness of the timeless runner

- Eu tenho muita pressa, tenho visões à noite, meus membros incham no esforço da fuga, sinto essa suspensão, essa coisa, esse monstro, falta-me ar, você mora aqui, tá, entende, sei que te perco em cada fase ruim, mas a pressa não me concede o sofrimento, olhe só os meus pés, veja-os de perto, são longos, quase fugidos do corpo e me doem quando paro ao seu lado, mesmo assim prometo...


- Ummm, sabe, eu não tenho essa pressa, não preciso de sua ligeireza, não sou jovem, não se engane ao se deparar com meus sonhos, e com essas quatro negações, digo: estou fora do tempo. Aquieto-me em frente a cada árvore, detenho-me para ouvir todos os sons, meus olhos atentos seguem as abelhas, seguem os pássaros dando suas piruetas, seus shows no ar. Enterro minhas mãos nas águas turbulentas e elas me lembram você. Fico rindo, petrificada nesse qualquer lugar e tudo, tudinho me lembra você; pássaros azúis me lembram você, pássaros amarelos me lembram você. Não sei bem como, quase não encontro, quase não te acho, reparo nas asas que têm nos pés... ah, às vezes surpreendo-me tentando lembrar o seu rosto. Você é quase uma miragem ao meio-dia.


- O quê? O que é, guria? Você quer que eu amance? Quer calma? LENTIDÃO? Olhe pra mim, nem estou aqui por inteiro, se é que existo! Seus passos atrapalham-me a direção, meu coração palpita toda vez que você pára. Tenho medo que morra assim em pé, um limoeiro apodrecido. Nunca irei esquecer o seu rosto, ele fica aqui, prostrado bem aqui, refletido no rosto de toda a alma miserável com a qual esbarro na rua.


- Então como vai ser? Você quer um final de filme clássico, daqueles com beijos e partidas e whiskys esquecidos no balção? Se é tão importante, finjo até correr, finjo até precisão, nem notará que estou, na verdade, ondulando lentamente ao seu lado...


- Não, não há como parar, nós somos infinitos e essa linha, culpa sua, não desenlaça mais. Nem minha lepidez ajudará.


- Quem mandou correr esses em círculos em volta de mim?


- Distraí-me por um momento. Mas diga; você não pensa no futuro?


- Não se lembra? Parece que nunca se lembra. Estou fora do tempo, essa exatidão, esse futuro para o qual você insiste em correr, é um peso só seu.


- Desculpa.


- Não agora, continue a correr, daqui a pouco chegarei lá, aí prometo...